Ela faz parte daquele raro grupo
de mulheres que não precisam ter medo da solidão. E não somente por sua beleza
(quase intacta mesmo com os anos se somando). Ela tem aqueles atributos não
identificáveis isoladamente mas que fazem com que os homens a queiram. E
principalmente, que não sumam depois de conseguir o que queriam. Coisa de
família. Sua mãe, já com sessenta e muitos, desde que separou do segundo
marido, há mais de dez anos, nunca deixou de ter namorado (às vezes mais de um
ao mesmo tempo).
Quando o conheceu, há um ano e meio, apresentado por uma amiga
comum, ela não o achou
particularmente bonito. Seu sorriso sim, era absolutamente encantador. Um homem
que estava para entrar na faixa dos cinquenta e trazia na bagagem um casamento
desfeito recentemente que havia deixado muita mágoa. Ela também vinha de um
relacionamento desgastante então começaram devagar. Mas desde o início se deram
bem. Ela era atenciosa e muito carinhosa. Ele mostrou-se um bom ouvinte e um
amante dedicado. Seu ponto alto
foi quando, um dia, o ex dela apareceu criando confusão e ele resolveu o
quiprocó com cavalheirismo.
Se viam pouco durante a semana
mas começaram a passar todos os fins de semana juntos, alternando os apês,
sempre muitos paparicos de parte a parte. Foi ele quem disse primeiro “Eu te amo”. A afinidade foi
crescendo e a confiança se consolidando dia a dia. É claro que ainda carregavam tristezas que de tempos em
tempos se manifestavam em olhares perdidos, pequenas ausências. Uma vez ela chorou sem motivo aparente e
ele teve ciúmes, mesmo sem saber bem do quê. Em outra ocasião ele a chamou por
uma apelido diferente que ela suspeitou era como ele se dirigia à ex-esposa. Deixou pra lá mas ficou
o registro. Não eram crianças, sabiam que o outro tinha um passado e que teriam
que conviver com isso que quisessem “dar certo”.
Para as amigas próximas ela disse
que estava novamente feliz mas que jamais se casaria novamente, ou literalmente,
“namorar é muito bom. Jamais estragarei isso colocando outro homem dentro de
casa.” Mas nunca falaram desse
assunto diretamente. Não tinham urgência, aproveitavam a alegria de estarem
conectados com alguém outra vez. A família dela o aprovou e os amigos dele a
acolheram com entusiasmo.
No fim do ano ela o convidou para
passar a noite de natal na casa de sua irmã. Ele ganhou uma bonita camisa e ela
uma caixa de DVDs da sua série de TV favorita. Enfim tinham aquela vida sem
sobressaltos que ambos tantos desejaram
quando estavam na pior.
Depois que se beijaram veio a
surpresa: um anel jazia na mão dele. O
pedido de casamento veio em seguida.
Era um daqueles momentos
cruciais, onde uma palavra ou mesmo uma expressão errada pode por tudo a perder,
e ela sabia disso. Por que ele não podia deixar as coisas como estavam? Sim, se
amavam e isso não era o suficiente? Tentava escutar seu coração mas só ouvia o
medo, medo de dizer sim e tudo desandar, medo de dizer não e o perder. Um
calafrio percorria-lhe a espinha. Ele, levemente emocionado pela situação e
pelos dois prossecos a mais que bebeu para tomar coragem, esperava uma resposta.
Ela precisava ser forte, deus ex machina por um segundo ou dois. Será que ele
esquecera do desgaste que viver junto acarreta? Será que ele não lembrava mais
do amor se esvaindo a cada pequena pendenga da casa. Ou por causa de dinheiro?
Lembrou que suas relações anteriores também haviam começado com amor infinito e
terminado às turras. “São todas assim. Ou se enterram na hipocrisia”, pensou. Sim,
era isso mesmo. Com cuidado eles conversariam e tudo permaneceria igual. Ele
entenderia, afinal a amava, afinal era amado, o que mais importava? Então ela
segurou-lhe as mãos com firmeza, olhou-o nos olhos mas quando sua boca abriu
ela disse simplesmente “sim”.
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