O celular toca no meio da tarde. Sem meus óculos não vejo o número de quem liga. Atendo, a voz é de homem e me soa vagamente familiar. Quando finalmente a identifico vem a consternação: sou eu mesmo do outro lado, na realidade um eu de anos atrás. Nossa conversa é caótica, um Déjà Vu perturbador. Ele me odeia por muitas coisas, algumas com motivo, mas principalmente pelo que represento: seu fracasso iminente. Eu próprio já estive do outro lado da ligação, também cheio de certezas. Não consigo convencê-lo da inutilidade de tudo aquilo. Quanto mais ele vocifera mais cansado eu fico. Depois de alguns minutos encerramos sem chegarmos a qualquer conclusão, é claro.
O episódio todo parece um infeliz conto borgeano. Horas depois ainda ouço-lhe a voz.
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